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Ano novo

Hoje, não sei por que, me deu vontade de escrever sobre alguma coisa que não tem existência real, mas que, mesmo não existindo, ocupa uma dimensão enorme em nossa existência. Eu falo do tempo, esse controlador invisível das nossas ações que, dimensionado pelo homem em anos, meses, dias ou minutos, nos espreita a cada manhã, testemunhando cada marca de expressão em nosso rosto, cada limitação que se soma ao nosso corpo.

Andam dizendo por aí, há milhares de anos, que o ano é novo a cada ano. Uma artimanha criada pelo homem para organizar-lhe a vida ou atazanar-lhe o espírito com horários e responsabilidades e, quem sabe, renovar-lhe as esperanças, oferecendo sempre a chance de um recomeço, como se tivesse havido alguma interrupção real no processo. De fato, nós é que passamos, nós e tudo aquilo que nos cerca.

Aliás, como disse o filósofo de Könisberg, o tempo não existe… e nem o espaço. São artimanhas mesmo para que o nosso espírito possa entender a complexidade deste mundo vário. Ah… se não tivessem inventado esse artifício, o mundo seria (como se não fosse) um imenso hospício, com tudo amontoado. Fatos e coisas se interpenetrando… uma balbúrdia para o nosso entendimento.

O espaço e o tempo são prateleiras organizadoras onde colocamos as partes dispersas da nossa existência. São aquelas “caixinhas porta-tudo”. Ali, tudo cabe e se organiza. Assim, inventamos o calendário, para dar ares de existência a esse tempo. E há calendários adornados de paisagens várias, com os dias para se riscar ou arrancar, como se fossem momentos para se tirar da lembrança. Outros, adornados de mulheres e expostos em oficinas mecânicas, como verdadeiros lenitivos para alimentar a libido e assanhar os sonhos, dando sentido à dura vida diária. Ah… se não houvessem essas prateleiras organizadoras.

Os homens inventaram e nomearam cada mês com um nome próprio e significativo. O janeiro, tiraram de Janus, o deus que protegia as portas de Roma; o fevereiro veio das festas de purificação, chamadas Fébruas, para afastar os maus espíritos; o março, tirou-se de Marte, o deus da guerra; para abril, reservou-se uma homenagem a Aprilis, que pode se referir à espuma do mar onde teria nascido Vênus, a deusa do amor; maio, se ligaria a Maya, uma deusa romana; Junho, uma referência à Juno, a deusa romana que protegia as mulheres casadas e a maternidade; julho, uma homenagem ao grande governante romano Júlio César, e agosto, em referência a Augusto César, o maior dos governantes de Roma.

Aí o calendarista deve ter se cansado de procurar relações para meses e nomeou os demais apenas em referência à sua posição ordinal no ano: setembro, outubro, novembro e dezembro. É claro que no início, o ano tinha dez meses.

Abstração ou não, o tempo já faz parte da nossa vida e é impossível nos libertarmos do calendário e do relógio. A cada período nos despedimos de um abstrato e hipotético ano velho que se encerra e nos abraçamos a um abstrato e hipotético ano novo que se inicia. E o fazemos com o espírito cheio de esperanças em um mundo melhor. Talvez seja essa esperança o combustível para suportarmos os erros e os equívocos produzidos por nós mesmos e que iremos, com certeza, repetir no próximo “novo ano”. Afinal, a esperança acaba sendo um adiamento perpétuo das ações que gostaríamos de realizar, mas que permanecem povoando apenas os nossos sonhos…

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