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O FANTASMA DO RIO

Um rio é sempre associado a uma paisagem bela e à própria vida da região que ele banha. Às vezes navegáveis, às vezes caudaloso, os rios já motivaram pintores e compositores em todas as partes do mundo.  Suas águas atraem os homens que constroem às suas margens as vilas e as cidades, com suas fábricas e sua poluição. São raras as cidades que não têm a sua origem e vida ligadas a um rio, por maior ou menor que ele seja.

Rios como o Ródano, o Sena, na França; o Reno, que corta a Europa de sul a norte; o Danúbio, que dá vida e beleza às cidades de Budapeste, Viena e Belgrado; o Tibre ou Tevere, como é chamado em Roma, memória viva do povo do Latio; o majestoso Amazonas, com a sua memória de lendas e mistérios; o Paraná, ou os lendários Tigre e Eufrates que deram origem à Mesopotâmia, todos eles têm o seu significado e a sua história como o nosso mal cuidado rio Muriaé, que para nós, muriaeenses, é o rio mais importante.

O rio Muriaé já saiu incontáveis vezes do seu leito, como se, erguendo-se de seu leito, pudesse lançar o seu grito de protesto e de socorro à população que o agride ano após ano, poluindo as suas águas e destruindo-lhe a vida. A cada ano o nosso rio, pequeno em relação aos gigantescos rios do mundo, avoluma-se com as suas cheias, mas represado pelas obras dos homens que o cercam, espraia-se pela cidade e agride o agressor como que num revide, transformando-se no fantasma dos homens.

Este ano, com os violentos temporais da semana que passou, quase se transformou naquele mar de catástrofe que já foi tantas vezes. Por pouco não se pôs de pé em seu leito e invadiu as nossas ruas e praças. Mas a lição de cada ano não é aprendida. Nem pelos que governam e nem pelos que poluem o rio e elegem os que governam.

A cada ano assistimos às promessas das obras que acabariam de vez com as enchentes e acalmaria o descontente rio aquietando-o em seu leito. A cada ano ouvimos aquela mesma cantiga de uma nota só como o samba do Jobim.

Todo rio se descontenta mesmo com os homens que o cercam e mesmo onde os homens são poucos, os rios se descontentam também e costumam sair do seu leito e dar um passeiozinho pelas redondezas fazendo imensos estragos. Os rios da Amazônia fazem isso todos os anos e o que tem menos por aquelas bandas são homens… principalmente muriaeenses.

Mas quando o rio já está cercado pela cidade, o homem já tomou posse de suas margens, aí o problema é diferente e os homens que o cercaram são responsáveis por medidas que solucionem o problema. Retirar a cidade do lugar já não é mais possível. A solução é viabilizar a passagem do rio modificando o seu leito, elevando pontes, aumentando a sua caixa no perímetro urbano. Recursos…ah, para com isso! O que nunca faltou nesse país foram recursos. O que sobra são corruptos e chefes de quadrilhas que abocanham os recursos e, mesmo condenados em segunda Instância, ainda ficam soltos com habeas e mais habeas. Aliás, “Habeas Corpus”, no Brasil, deveria se chamar “Lábias Corpus”.

Mas deixando o mar de lamas e voltando ao rio, todos os anos o nosso rio Muriaé tem mesmo essa mania de grandeza. Quer transitar em corredeiras rápidas e fortes e produzir aqueles sons estrondosos de antigamente. Compete a nós amansá-lo, mesmo no período das cheias. Depois, como eu já disse em uma de minhas crônicas, o nosso pequeno rio, cansado e maltratado pelos homens,  pede emprestado o leito do rio Paraíba para realizar o seu sonho de ser mar…

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