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O país tropical

Em 1969, em plena ditadura militar, época dos chamados anos de chumbo, Jorge Ben, hoje Jorge Ben Jor, lançava a sua música talvez de maior sucesso, “País Tropical”. Cantava e encantava o seu público com os versos “Moro num país tropical, abençoado por Deus e bonito por natureza”. Talvez por isso essa bela música não tenha sido censurada naquela época, pois falava de beleza, de carnaval em fevereiro e de um menino de mentalidade mediana, que tinha um fusca e violão, além de uma nega chamada Tereza, mas era feliz. Quer coisa melhor?

Pois é. Lá se vão 50 anos, popularmente chamados de meio século. O tempo passou rapidinho e o país tropical virou uma democracia. Não tem mais a repressão militar, a tortura e não se fala também em censura. Temos uma Constituição chamada por Ulisses Guimarães de “cidadã”, que foi promulgada efusivamente em 05 de outubro de 1988 pelo Congresso Nacional.  A expansão dos direitos sociais é um capítulo à parte nesta Constituição “cidadã”. Seria, por certo, um enorme avanço na História do Brasil se os tais direitos sociais não tivessem ficado somente naquelas páginas da Carta Magna. O que mais se vê são os privilégios para poucos e os sofrimentos intermináveis para muitos. Educação, saúde, saneamento básico, moradia digna, direito de ir e vir com segurança são apenas sonhos de uma população que se tornou órfã dos princípios da cidadania.

No “país tropical”, não tem vendavais, não tem furações, vulcões e nem terremotos. Poderíamos, portanto, cantar como Ben Jor: “que beleza!”. Mas a nossa realidade é bem diferente. Se não temos esses eventos trágicos que são próprios da natureza, se não temos mais as torturas e a repressão daqueles anos de chumbo, carregamos hoje o peso do poder paralelo do banditismo, do narcotráfico e das milícias que comandam favelas sob os olhares lenientes de governos ineptos.

Se por um lado temos a liberdade de expressão e podemos informar à população todos os malfeitos dos poderes corruptos sem sermos censurados, temos, na contrapartida, a criminalidade imperando e aterrorizando a sociedade. Se temos as belezas naturais e cidades maravilhosas como o Rio de Janeiro, são nas suas comunidades carentes que perpetuam o volume de tragédias, umas sobrepondo às outras, numa sucessão de erros e covardias praticadas por aqueles que têm o dever de proteger a sociedade. O fato inconteste é que em sua maioria os eventos catastróficos são absolutamente previsíveis e acabam se constituindo em tragédias anunciadas. Mariana, Brumadinho, prédios sem estruturas desabando, concentração de jogadores incendiando, tiroteio em escola, fuzilamento de famílias em plena rua são exemplos de degradação da cidadania de pessoas que só queriam ter o direito de sonhar com uma vida melhor. Dizer mais o quê? Os horrores feitos pelas mãos dos maus vão deixando um rastro de desperdícios de vidas.

Fica apenas a esperança de que o país tropical seja mesmo abençoando por Deus.

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