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A Maria… da paz

Hoje vou fazer deste espaço uma pequena homenagem a uma irmã querida que nos deixou no último dia 6, assim como uma estrela que se apaga no firmamento, mas que continuará brilhando na memória de toda a família como aquela irmã inesquecível, parte inquestionável da nossa formação. Possuía uma sabedoria existencial inegável e uma memória de fazer inveja. Em sua cabeça, coberta pelos cabelos já prateados pelos longos anos de vida, estavam depositadas as recordações de família, dados, datas e referências que se foram com ela.

Seu nome era paz, como foi a sua vida. Era a mais velha dos irmãos e a conselheira de todos nós. Quando alguém na família adoecia, era a primeira a chegar, com a sua preocupação e o seu zelo.

Na realidade, ia se chamar Adalita, mas, para cumprir uma promessa da nossa avó, meu pai deu-lhe o nome de Maria da Paz, um nome a que fez jus durante seus 85 anos de vida. Era uma conciliadora e um suporte para todos nós. Os familiares a chamavam simplesmente de Dalita.

Foi uma competente e zelosa professora de Língua Portuguesa, percorrendo com desenvoltura os meandros da gramática em seus mistérios da sintaxe, da morfologia e do apreço pela correção linguística. Além de professora na E.E. Orlando de Lima Faria, no Colégio e Faculdade Santa Marcelina, era exímia preparadora de jovens para concursos, em aulas particulares. Ah… mas na culinária, a Dalita era insuperável. Curiosa nas artes da cozinha, descobria, experimentava e colecionava receitas, superando-se, com status de maitre na cozinha árabe.

Como primeira filha, experimentou as dificuldades econômicas dos nossos pais naquela longínqua década de 30. As dificuldades temperaram-lhe a alma e aperfeiçoaram-lhe o espírito, mas não foram capazes de tirar-lhe o seu senso de humor e o seu amor à vida. Por isso, foi sempre uma mulher de paz, como lhe destinava o nome de batismo. Não uma paz de subserviência ou de passividade, mas, ao contrário, uma paz aliada à energia e à defesa intransigente dos valores morais e da família.

Sua fé nas verdades cristãs e em suas orações era inabalável e a tornava destemida ante os obstáculos que a vida lhe impunha. Tinha uma certeza quase cartesiana numa outra vida após a morte física e na responsabilidade que tínhamos por nossos atos. Não tenho como ela essa certeza e vou trilhando minha vida, amparado num agnosticismo que me impede de afirmar ou de negar a existência de instâncias futuras.

Mas agora que não temos mais a nossa Maria e a sua paz, eu fico pensando, com as limitações do meu raciocínio que, de fato, pouco importa haver ou não haver outra vida depois desta. O que importa mesmo são as lembranças que deixamos na memória daqueles que ficaram. Lembranças construídas por nossas ações, como uma peça de teatro que é a nossa própria existência.

A Maria da Paz escreveu e representou com excelência a sua peça. Pena que no teatro existencial a apresentação é única e não temos o privilégio de pedir bis… mas por toda a sua história de vida e do muito que significou para nós, posso honrá-la com o meu caloroso aplauso.

 

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