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ARTE E MANHAS DE MINEIRO

Adellunar Marge

O brasileiro tem muitas artes e muitas manhas, aliadas ao bom humor que lhe é característico. Mas o mineiro é mais…muito mais do que isso.

A mineiridade confere a quem a possui certas características peculiares, certas maneiras de ser que só quem nasce nessas montanhas possui. O mineiro é mestre em “dar negócio”, fazer barganha(com volta…ou na orelha). Vencer uma disputa comercial é como dar um tombo no parceiro. Um tombo com chave de braço e tudo, que nem aqueles do tatame. Um tombo assim sem malícia e sem outra intenção além de levar a vantagem na transação. Diz um dito popular que três carros viajando em uma estrada você identifica qual é o do mineiro. Se a estrada tem barro, o mineiro vai atrás. Se a estrada é de poeira, ele vai na frente. Ah… mas se a estrada tem porteira, ele vai no meio.

Na semana passada eu me lembrei dessas mineirices quando estava em Juiz de Fora, transitando ali pela rua Halfeld. Fui abordado por um típico homem das montanhas, que portava uma enorme bolsa de pano e um sorriso amistoso, comprometido apenas pelo estado precário dos dentes. Aproximou-se de mim e foi logo dizendo:

– Meu pai vendeu a propriedade e mudou. Sabe para onde? Para o Amazonas. Tá lá no meio daquelas índias peladas. Estive lá mês passado. Trouxe até essa poderosa banha de quatis pa-

ra dores nas costas. Tome uma para você, é presente…!

Ato contínuo, tirou da bolsa uma latinha de metal brilhante, colocou dentro de um envelope e me entregou. Depois, tirou outra latinha e disse:

– Esta é para a sua esposa. Deixa só vinte reais para o guaraná ! (Era ali que estava o tombo).

Foi naquele instante que eu me lembrei que tempos atrás eu já havia sido abordado por ele, com a mesma conversa. Na época, ele oferecia uma pomada com virtudes afrodisíacas, de efeito infalível e não conseguira me vender. Agora ele estava ali de novo e eu tinha de sair da conversa dele com astúcia. Afinal, eu também sou mineiro. Disse então para ele:

– Ih, chefe, infelizmente não vai dar ! Estou sem dinheiro e só tenho cartão!

Mas aí me lembrei. E se ele disser que tem a maquininha de cartão? Então completei:

– …e o meu cartão deu problema e o gerente disse que se eu insistir ele pode ser bloqueado.

O sabido então, pegou as latinhas de pomada de volta e perguntou se eu não me importava de pegá-las dali a pouco e que ele estaria ali por perto do Cine Central. Eu, doido prá me ver livre dele, respondi que estava tudo bem e que tão logo resolvesse o caso do cartão eu o procurava. É claro que nem que a porca torcesse o rabo eu o procuraria…

Ele bem que tentou, mas pela segunda vez eu dei uma volta nele. O processo que ele usa não deixa de ser uma técnica de venda. Trabalhosa, mas muito engenhosa. Por um momento o abordado chega a pensar que conhece o pai dele e que existe até uma relação de intimidade familiar. Quando o parceiro perceber… já comprou as latinhas de banha de Quatís e o vendedor já estará dando o bote em outro freguês.

Dizem que é difícil um mineiro dar um tombo em outro mineiro. Se ocorrer tombo, costumam cair os dois.

Mas tem muitas vantagens em ser mineiro. A nossa história é mais interessante do que a dos outros, os nossos “casos” prendem mais a atenção e as nossas intenções são mais discretas. O mineiro ruma para um objetivo sem muito alarde por isso suas vitórias são mais consistentes.

Disse um cronista certa vez, e com muita propriedade, que ser mineiro, mais do que tudo, é um estado de espírito…

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